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A Crise Psíquica na Era Neoliberal: A Realidade que Ninguém Quer Encarar
2024-12-18
Autor: Ana
Introdução
Nos últimos dez anos, pesquisadores da Universidade de São Paulo têm se dedicado a uma investigação que culminou no livro "Neoliberalismo como Gestão do Sofrimento Psíquico". Esta pesquisa, desenvolvida pelo Laboratório de Teoria Social, Filosofia e Psicanálise da USP, tem como objetivo analisar as profundas transformações que indivíduos enfrentam na atual ordem econômica e sua relação com o sofrimento psíquico.
Debate sobre categorias clínicas
Diante da crise da universidade pública no Brasil, esses investigadores abrem um importante debate sobre as categorias clínicas que operam dentro da psiquiatria e psicologia. Seriam diagnósticos como "transtorno de personalidade histriônica", "neurose obsessiva" e "esquizofrenia" expressões de realidades biológicas ou construções sociais influenciadas pela cultura e economia? A interrogação levanta um ponto essencial: as categorias clínicas realmente refletem condições naturais, ou são, na verdade, convenções sociais que moldam e, em muitos casos, distorcem a experiência do sofrimento?
Conexão entre norma social e dominação
Essas questões ressaltam como, na verdade, a norma social está intrinsecamente ligada a um sistema de dominação que busca controlar os desvios daquilo que é considerado aceitável na sociedade. Podemos apontar que, na era neoliberal, a pressão por conformidade social tornou-se brutal, e o sofrimento psíquico se institucionalizou, se tornando uma moeda corrente. De acordo com estudos recentes, cerca de 13,5% da população brasileira está diagnosticada com transtornos depressivos, enquanto 9,7% enfrenta transtornos de ansiedade. Esses números alarmantes falam de um país onde a luta pela saúde mental se intensifica em meio a um contexto de desigualdade social crescente.
Liberdade individual e opressão
O cenário que temos hoje é de um neoliberalismo que torna a ideia de liberdade individual uma armadilha, incutindo na sociedade um sentimento de que cada um é responsável por seu próprio sucesso ou fracasso. O que nos leva a questionar: até que ponto essa autonomia não é uma forma de opressão disfarçada? A proeminência dos discursos de empreendedorismo e autossuficiência encobrem as violências estruturais que moldam a vida de muitos.
A demanda por adaptação radical
Enquanto o discurso do empoderamento individual se torna predominante, muitas vezes se ignora a realidade de que a sociedade contemporânea demanda uma adaptação radical, atravessando as identidades de gênero, classe e raça. O neoliberalismo amplia as formas de sofrimento psíquico através da intensificação das relações de competição, da redução das interações sociais significativas e da imposição de uma lógica de produtividade que aliena indivíduo das relações afetivas.
Crise psíquica contemporânea e resistência
Além disso, a crise psíquica contemporânea não é apenas um fenômeno individual; ela se reflete em explosões sociais e em movimentos coletivos de resistência. O que vemos, portanto, é a interseção de realidades sociais e pessoais que se manifestam em angustias coletivas. A crise do reconhecimento social torna-se um dos pilares para entender essa perpetuação de sofrimento. Jacques Lacan, um dos principais teóricos dessa discussão, afirmou que muitas das nossas dores são, em realidade, gritos de reconhecimento dentro de uma estrutura social que fragmenta identidades.
Reavaliação da psiquiatria e ciências psicológicas
Frente a essa realidade, a psiquiatria e as ciências psicológicas precisam urgentemente reavaliar seu papel. A extensão indefinida das categorias clínicas e a patologização de qualquer forma de mal-estar ignora as bases sociais e políticas que geram sofrimento. Em uma sociedade onde se pede cada vez mais performatividade a cada indivíduo, o alívio para o sofrimento não pode ser encontrado na simples administração de diagnósticos, mas em uma revolução nas estruturas de poder que perpetuam tal crise.
Conclusão
Portanto, a crise psíquica que enfrentamos não é um fenômeno individual, mas um sintoma de uma sociedade em desagregação, exigindo nossa atenção e ação. O dever de cada um que se preocupa com a saúde mental e justiça social é não apenas absorver o sofrimento, mas buscar formas de transformá-lo em resistência e mudança. Essa é a única maneira de interromper a repetição desse ciclo vicioso que envolve a opressão e a alienação em nome de uma suposta liberdade.