
Argentinos Compram Mais Produtos Estrangeiros Enquanto Milei Fortalece o Peso
2025-03-24
Autor: Lucas
As importações na Argentina estão crescendo de forma acentuada, com o presidente libertário Javier Milei apostando em um peso forte e em produtos estrangeiros de baixo custo para combater a inflação, mesmo que isso pressione as já limitadas reservas de dólares do país.
Após uma recessão que havia severamente afetado as importações, a Argentina começou a abrir sua economia protecionista e, nos últimos seis meses, o comércio de entrada aumentou 30% em comparação com o período anterior, segundo a agência nacional de estatísticas.
Alimentos como massa italiana, pão brasileiro e manteiga uruguaia agora dominam as prateleiras dos supermercados, com os varejistas quase dobrando as importações alimentícias nos primeiros dois meses de 2025 em relação ao ano anterior. Importações de equipamentos como células solares aumentaram dez vezes, enquanto agricultores quadruplicaram as compras de tratores no exterior.
A estratégia de Milei para fortalecer o peso e relaxar as restrições sobre importações tem ajudado a controlar a inflação em ascensão, mas envolve riscos. Ao gastar cada vez mais dólares e com dificuldades em acumular reservas, o país se torna mais vulnerável a choques externos que poderiam reverter os ganhos na economia.
A pressão está aumentando sobre Milei para garantir um empréstimo do FMI (Fundo Monetário Internacional) para replenishing as reservas, prometido para ser liberado em abril.
A valorização do peso virou tema delicado na política argentina, com Milei atacando economistas que abordam os riscos dessa valorização como "econofraudadores". Vários varejistas evitam comentar oficialmente o papel do peso nesse aumento das importações, temendo descontentamento por parte do presidente e dos fabricantes locais.
Além disso, as importações da China cresceram rapidamente, com mais que o dobro em fevereiro comparado ao mesmo mês do ano passado. Líderes empresariais visitam a China em busca de fornecedores, enquanto compras anteriormente restritas via serviços de comércio eletrônico, como Alibaba, dispararam.
"As pessoas estão lotando os armazéns de carga no aeroporto de Buenos Aires com caixas", afirmou Ruben Minond, proprietário da loja de bicicletas Tienda Bike, que está aumentando as compras de produtos chineses como luzes e acessórios, e planeja começar a importar bicicletas em contêineres.
"Estou comprando mais no exterior do que localmente agora, pois é mais barato e muito mais fácil", acrescentou Minond.
Embora o nível atual de importações de US$ 5,9 bilhões em fevereiro não seja inédito na Argentina, o crescimento súbito reflete a delicada balança que Milei deve manter para conseguir estabilidade duradoura.
Para equilibrar a redução da alta inflação e reiniciar o crescimento econômico, o presidente recorreu a rígidos controles cambiais. Após uma desvalorização significativa quando assumiu o cargo em dezembro de 2023, Milei permitiu uma leve queda de 2% ao mês no peso no ano passado, o que fortaleceu a moeda em 47% em termos reais.
Apesar de a valorização do peso aliviar a pressão sobre os preços, também tornou os produtos locais muito mais caros em comparação a outras nações, além de elevar o poder de compra dos argentinos no exterior. De fato, o número de argentinos viajando para o exterior teve um aumento considerável, pois o peso forte torna as viagens para praias brasileiras e shoppings chilenos mais acessíveis. Em janeiro, a Argentina reportou seu segundo maior gasto mensal em dólares com turismo, totalizando US$ 1,5 bilhão.
Consequentemente, o país tem registrado um déficit em conta corrente desde junho, e seu superávit comercial de bens caiu para apenas US$ 224 milhões em fevereiro, após ter superado US$ 1 bilhão na maior parte de 2024.
"Esse é o efeito colateral da política de câmbio rígido", declarou Ramiro Blazquez Giomi, estrategista da StoneX. "No curto prazo, o déficit crescente pressiona a disponibilidade de dólares que o governo precisa para manter a moeda estável e evitar picos de inflação."
Infelizmente, a Argentina está recebendo pouco investimento estrangeiro e não pode tomar empréstimos nos mercados de capitais. Com isso, Milei enfrenta o desafio de acumular as reservas do banco central, que permanecem em torno de US$ 6 bilhões no vermelho, excluindo passivos.
No entanto, o governo não se deixa abater e está cortando tarifas e regulamentações alfandegárias em diversos produtos. "Continuamos diminuindo impostos e tarifas para estimular a concorrência e reduzir a inflação", afirmou o ministro da economia, Luis Caputo.
Apesar das esperanças de estabilidade, líderes do setor manufatureiro já alertaram de que o aumento das importações pode provocar demissões no setor que representa quase um quinto do emprego no país. Funcionários do governo, por outro lado, argumentam que os fabricantes podem se beneficiar da importação de peças mais baratas, tornando-se assim mais competitivos.
Milei prometeu evitar uma desvalorização considerável do peso. Se conseguir, "veremos um crescimento substancial nas importações de bens e um aprofundamento do déficit em conta corrente este ano", afirmou Mart'in Rapetti, diretor do think tank Equilibra. "Estamos observando uma taxa de câmbio real historicamente alta, que é o principal motor desse aumento nas importações", concluiu. Em contrapartida, Dante Sica, ex-ministro da produção, acredita que a crescente demanda por importações começará a estabilizar, prevendo que as exportações de petróleo e gás compensarão as importações, permitindo que o saldo comercial permaneça positivo. As exportações desse setor podem gerar um superávit de até US$ 8 bilhões este ano, conforme a produção se expande em um vasto campo de xisto na Patagônia.