Desespero e Superação: O Caos do Tratamento do Câncer no SUS e as Promessas Não Cumpridas
2024-11-17
Autor: Lucas
“Se eu depender apenas do SUS, estaria perdida.” O desabafo de Edivânia Patrícia de Paula Santos, de 47 anos, ilustra as angústias que muitos pacientes enfrentam para receber tratamento oncológico na rede pública de Belo Horizonte. Diagnosticada com câncer de mama em estágio avançado, ela investiu cerca de R$ 4.500 apenas em exames particulares para acelerar o tratamento e escapar da morosidade do sistema.
Recentemente, durante sua campanha eleitoral, o prefeito reeleito Fuad Noman (PSD) também teve sua própria batalha contra um tumor que o fez prometer aos cidadãos belo-horizontinos um atendimento semelhante àquele que experimentou na rede particular. O diagnóstico do prefeito ocorreu em julho, e ele finalizou seu tratamento em apenas quatro meses, ressaltando a urgência que um tratamento adequado exige.
A situação parece um pesadelo para Edivânia, que teve que recorrer a exames privados e à ajuda de familiares para viabilizar seu tratamento a tempo. "Acho que os gestores do SUS não percebem que o atendimento deve ser para ontem", lamenta.
Ela recorda a descoberta do câncer, que aconteceu quase que por acidente, durante um autoexame. A partir de um caroço que ela identificou, sua jornada se tornou uma corrida contra o relógio, marcada pela burocracia e a falta de agilidade do sistema público. Uma mamografia revelou que se tratava de um câncer avançado, e a consulta com o oncologista demorou mais de um mês, retardando ainda mais o início do tratamento, que em Belo Horizonte pode demorar até cinco meses.
Edivânia, que está deixando para trás os momentos difíceis após o tratamento, não é a única. Sérgio Lopes Ferreira, de 45 anos, também passou por um calvário. Morador de Esmeraldas, na Grande BH, ele relata uma luta constante apenas para conseguir atendimento médico, enfrentando até noites na calçada para não perder consultas, uma luta que se intensificava à medida que a dor aumentava e os exames eram adiados.
O diagnóstico de câncer de reto chegou tarde, quando o tumor já estava em estágio 3 e se espalhara para outros órgãos. Com uma vida cotidiana repleta de dificuldades — pai de sete filhas e único provedor da casa — Sérgio não teve escolha a não ser lutar incansavelmente. O medo de deixar sua família para enfrentar a doença o acompanhava todos os dias.
Além das experiências pessoais impactantes, a quantidade alarmante de casos de câncer na capital mineira merece atenção. Somente nos primeiros seis meses de 2024, Belo Horizonte registrou 6.907 novos casos da doença. Desses,615, ou quase 62,4%, não têm informações atualizadas sobre o início do tratamento nos sistemas do SUS. Os números são ainda mais preocupantes se considerarmos que Minas Gerais reportou cerca de 35.673 diagnósticos de câncer no mesmo período, com mais de 23.600 pacientes sem qualquer registro de tratamento.
Críticos destacam que a burocracia e a falta de recursos adequados no SUS têm agravado a crise, levando muitos pacientes a peregrinar pela rede de saúde em busca de atenção e cuidados que deveriam ser básicos. Enquanto isso, a promessa do prefeito Fuad Noman de melhorar o atendimento oncológico parece distante, com a falta de estrutura sendo uma barreira constante.
A assistente social Adélia Glória de Souza, do Instituto Mineiro de Prevenção e Assistência ao Câncer (Impac), observa que muitos pacientes chegam em condições críticas devido à demora para diagnósticos e tratamentos. A falta de um plano de prevenção mais eficaz e acesso facilitado a exames de rotina são outros fatores que precisam ser urgentemente abordados. Por enquanto, histórias de resistência e coragem, como as de Edivânia e Sérgio, ecoam em meio ao desespero de muitos.
No Brasil, o câncer se tornou a segunda principal causa de morte, com mais de 600 mil novos casos esperados em 2023. A falta de acesso a diagnósticos precoces e a tratamento adequado exacerba a tragédia enfrentada por milhares de brasileiros todos os dias. Com a crescente pressão sobre o sistema de saúde, especialistas pedem urgentemente uma revisão nas políticas públicas e um investimento significativo no SUS, para que possa atender adequadamente a população.