Ciência

Desextinção: A Promessa de Recriar o Mamute Desperta Debates Éticos e Ambientais

2024-10-14

Autor: Gabriel

A ideia de desextinção, que antes parecia um conceito oriundo da ficção científica, agora se torna uma realidade palpável graças a recentes avanços na biotecnologia. Em julho, a revista Cell, uma das mais respeitadas publicações científicas do mundo, anunciou a reconstrução de cromossomos de um mamute (Mammuthus primigenius) que viveu há 52 mil anos na Sibéria.

A empresa americana Colossal Biosciences revelou planos audaciosos: especialistas afirmam que os primeiros filhotes de mamute poderão nascer em 2028. Entretanto, a realidade pode ser um pouco diferente do que muitos esperam. Os primeiros seres a emergirem desse projeto revolucionário não serão exatamente mamutes, mas sim híbridos, uma combinação de elefantes e características mamutais, resultantes de técnicas de biologia sintética, bioinformática e clonagem. Isso significa que teremos criaturas de carne e osso, mas tão naturais quanto um algoritmo de inteligência artificial.

Isso levanta questões intrigantes. Até agora, a empreitada de sequenciar o genoma de espécies extintas teve sucesso principalmente em hominídeos, como o Homem de Neandertal, cujas sequências foram decifradas por uma equipe liderada pelo Nobel Svante Pääbo. O mesmo Pääbo também sequenciou o genoma do Denisovan, outro parente humano extraordinário.

As ambições da Colossal Biosciences vão além do mamute. A empresa também anunciou planos para recriar o tilacino (Thylacinus cynocephalus), extinto em 1936, e o dodo (Raphus cucullatus), uma ave que foi erradicada das Ilhas Maurício em 1681 e se tornou um símbolo da extinção causada pela ação humana.

Adicionalmente, iniciativas como a da Taurus Foundation visam trazer de volta o auroque (Bos primigenius), que também foi extinto devido à caça. Utilizando o DNA de raças de bovinos modernas do Sul da Europa, a fundação planeja recriar o genoma do auroque, imortalizado em pinturas rupestres da caverna de Lascaux.

O CEO da Colossal, Ben Lamm, afirmou que estamos mais próximos da desextinção do que muitos imaginam, prometendo o nascimento de filhotes de mamute. Contudo, ele ressalta que é “altamente provável que outra espécie extinta retorne à vida antes do mamute”.

No cerne do projeto está a inserção de genes essenciais no DNA de elefantes asiáticos (Elephas maximus), que são os parentes vivos mais próximos dos mamutes. Esses genes estão ligados a características específicas como pelagem densa, presas longas, e adaptações para o frio.

No entanto, os desafios são enormes. O genoma do mamute ainda é em grande parte desconhecido e muitas características genéticas desejadas permanecem um mistério. Love Dalén, paleontólogo sueco e conselheiro da Colossal, lidera a equipe que busca sequenciar o genoma da espécie utilizando DNA de mamutes congelados.

Embora os cientistas tentem aproximar-se da forma original dos mamutes, Dalén admite que é improvável que consigam criar cópias idênticas. Para isso, a Colossal adquiriu mais de 60 amostras de DNA de mamutes, buscando entender sua estrutura genética. O desafio está em identificar e sintetizar esses genes para editá-los no genoma do elefante. A expectativa é que, através de clonagem, um embrião híbrido possa ser gerado e implantado em uma mãe de aluguel, possivelmente uma elefanta.

A desextinção traz à tona questões éticas e ambientais significativas. O mundo em que essas criaturas viviam não existe mais, e muitos cientistas alertam para o risco de desequilíbrios ecológicos. Para eles, reviver espécies extintas é mais um teste do poder tecnológico humano do que um esforço genuíno de conservação.

Um consenso entre os especialistas é que seria mais eficaz prevenir a extinção das espécies atuais do que ressuscitar as que já se foram. O exemplo do íbex-dos-Pirineus, que teve um clone criado em 2003 que viveu por apenas sete minutos devido a problemas de saúde, ressalta a fragilidade desses esforços. O clone foi gerado a partir do DNA da última fêmea da espécie, que havia morrido em 2000.

O geneticista Mariano Zalis, da UFRJ, explica que o maior obstáculo para trazer de volta figuras como o mamute é a dificuldade em encontrar DNA íntegro. O estudo de genomas antigos é complexo, e a maioria do DNA coletado se degrada rapidamente. Hoje, a equipe busca decifrar o que as informações genéticas realmente dizem, um projeto monumental.

Com vantagens como o dodo, que tem seu genoma quase totalmente sequenciado, e o tilacino, cujas amostras são de qualidade superior, ambos podem ter uma chance maior de retorno às suas existências originais antes do mamute. O maior medo é que esses esforços possam ser mal direcionados e acabar por causar mais danos do que benefícios ao ecossistema que agora abriga diferentes formas de vida.