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É possível 'recongelar' o Ártico? Startup propõe solução, mas cientistas levantam bandeira vermelha

2024-12-16

Autor: Lucas

Uma ambiciosa startup chamada Real Ice propõe um projeto para aumentar a espessura do gelo no Ártico em mais de 1 milhão de quilômetros quadrados, o equivalente a duas vezes o tamanho da Califórnia. O objetivo é retardar ou até reverter o alarmante derretimento do gelo durante os meses de verão. Este tipo de intervenção é conhecido como geoengenharia, uma prática que envolve manipulações no ambiente na tentativa de mitigar os efeitos das mudanças climáticas.

Contudo, essa ideia não é unânime na comunidade científica. Especialistas expressam sérias reservas sobre a eficácia e os perigos inerentes à geoengenharia. Jennifer Francis, cientista sênior do Woodwell Climate Research Center, afirma que, embora o gelo pode realmente se tornar mais espesso e refletivo em áreas adjacentes às bombas de resfriamento, existe uma dúvida persistente sobre a viabilidade de manter esse gelo por tempo suficiente para impactar a crise climática. "Tenho sérias dúvidas", afirmou à CNN.

A professora Liz Bagshaw, da Universidade de Bristol, também levantou questões sobre a moralidade e a escalabilidade do projeto, considerando essas intervenções 'moralmente duvidosas' e 'eticamente irresponsáveis'. Além disso, um grupo de dezenas de cientistas, ao publicar um relatório no ResearchGate, enfatizou os riscos potenciais e consequências não-intencionais de projetos de geoengenharia no ambiente polar.

Carlos Nobre, renomado climatologista brasileiro, compartilha essa preocupação e alerta que soluções como a geoengenharia podem desviar a atenção da necessidade urgente de diminuir as emissões de gases de efeito estufa. De acordo com as últimas recomendações do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), a única maneira eficaz de combater o aumento da temperatura global é a redução significativa dessas emissões.

O clima é extremamente sensível, e se as emissões continuarem elevadas, poderemos enfrentar um aumento de mais de 2,5ºC até 2050. A ideia de que a geoengenharia possa restaurar o mar de gelo do Ártico parece, no mínimo, duvidosa. Vários estudos já indicam que a situação é alarmante, com a possibilidade de o mar de gelo do Ártico desaparecer completamente durante o verão antes de 2040.

A Real Ice ainda propõe um esquema semelhante a 'créditos de resfriamento', onde empresas poluidoras poderiam compensar suas emissões financiam a iniciativa de recongelamento. Andrea Ceccolini, co-CEO da Real Ice, admitiu à CNN que essa técnica pode provocar alterações no ecossistema marinho, como o crescimento excessivo de algas, mas acredita que os efeitos negativos seriam mínimos. "Qualquer intervenção terá suas consequências, mas o impacto de não fazer nada é ainda mais dramático", disse Ceccolini.

A controvérsia gerada por essa proposta de geoengenharia levanta questões cruciais: até onde devemos ir na tentativa de consertar nosso planeta? A urgência de ações climáticas não deve ser substituída por soluções de curto prazo que podem oferecer riscos ainda maiores à saúde do nosso ecossistema.