Cesar Lattes (1924-2005) é amplamente lembrado como um dos mais ilustres cientistas brasileiros e um dos que mais se destacaram a nível global, sendo indicado ao Nobel. No entanto, seu 'lado B', revelando as intensas batalhas que travou não apenas pela ciência, mas também por sua própria saúde, ainda é pouco conhecido pelo público. Para homenagear esse gênio no centenário de seu nascimento, os jornalistas Marta Góes e Tato Coutinho lançaram "Cesar Lattes: Uma Vida - Visões do Infinito", uma obra que se propõe a preencher essa lacuna.

Com a colaboração do jornalista Jorge Luis Colombo e de Maria Cristina Lattes Vezzan, uma de suas filhas, o livro de 320 páginas explora desde a infância de Lattes em Curitiba, filho de imigrantes italianos, até sua consagração em Bristol, no Reino Unido, onde fez a impactante descoberta do méson pi, conhecido hoje como píon, solidificando seu nome na história da física.

Diferente de uma obra de divulgação científica, o livro foca mais nos aspectos humanos e culturais da jornada de Lattes. Através de relatos fascinantes, a obra mostra o efervescente contexto da física de partículas e os desafios que Lattes enfrentou, gerando interesse pelo desenvolvimento científico no Brasil, em um período em que isso era crucial para a nação.

O livro também retrata a ambição e frustração de Lattes, que, mesmo sem o reconhecimento oficial do Nobel, dedicou-se incansavelmente a promover a ciência no Brasil. Ele foi um dos fundadores do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), buscando estabelecer o Brasil como um centro de referência em física experimental. Apesar de sua grande contribuição, ele enfrentou enormes desafios, incluindo a falta de apoio governamental e os entraves burocráticos que atrasaram seus esforços.

Uma parte impactante da biografia é a luta de Lattes contra o transtorno bipolar, uma condição que o acompanhou por décadas, trazendo episódios de mania e depressão. O livro revela a resiliência dele em buscar ajuda e continuar contribuindo para a ciência, apesar dos estigmas da época. Lattes foi internado várias vezes, mas nunca deixou que isso o impedisse de lutar por suas convicções e sonhos.

A vida de Lattes serve não apenas como um retrato de um gênio da ciência, mas também como um alerta sobre as dificuldades enfrentadas por intelectuais e cientistas no Brasil. Os jornalistas fazem paralelos com situações atuais, questionando como a perseguição a acadêmicos durante a ditadura militar possuem ecos na realidade contemporânea, onde a ciência ainda encontra resistência em certos círculos políticos.

A narrativa também cinge-se sobre a rica história da física no Brasil, enaltecendo nomes como Gleb Wataghin e Mario Schenberg, que prepararam o cenário para as contribuições de Lattes. O livro é uma ode à força e ao espírito de perseverança de um homem que lutou não apenas pela ciência, mas pela dignidade do seu país e pelo seu próprio bem-estar emocional.

"Cesar Lattes: Uma Vida - Visões do Infinito" não é apenas uma biografia; é um convite à reflexão sobre os desafios enfrentados por aqueles que dedicam suas vidas ao avanço do conhecimento, em um cenário que frequentemente se opõe à sua realização. A obra promete não apenas informar, mas também inspirar novas gerações a seguir o exemplo de Lattes, lutando pela ciência e pela saúde mental em meio às adversidades.