
Segredos do "Saara Verde": Genomas Revelam a História de Habitantes Antigos
2025-04-03
Autor: Maria
Hoje, a paisagem de Takarkori, localizada no sudoeste da Líbia, é marcada por extensas dunas de areia e rochas áridas. No entanto, há 7.000 anos, essa região do Deserto do Saara se apresentava como um cenário exuberante e acolhedor, repleto de vegetação e água.
Pesquisadores que examinam as origens dos habitantes do que é conhecido como "Saara Verde" descobriram os primeiros genomas completos de duas mulheres enterradas em Takarkori, fornecendo uma visão profunda sobre essa antiga civilização.
Historicamente, essa área era uma rica savana, repleta de árvores, lagos permanentes e rios que sustentavam uma fauna diversificada, incluindo hipopótamos e elefantes. A região também abrigava comunidades humanas primitivas, como as 15 mulheres e crianças encontradas sob os cuidados dos arqueólogos, que sobreviviam da pesca e da criação de ovelhas e cabras.
"Iniciamos a pesquisa com esses dois esqueletos por estarem excepcionalmente preservados — com pele, ligamentos e tecidos intactos", afirmou Savino di Lernia, coautor de um estudo publicado na revista Nature.
Esta é a primeira vez que arqueólogos conseguem sequenciar genomas completos de restos humanos encontrados em um ambiente tão quente e árido, sublinhou di Lernia, professor da Universidade Sapienza de Roma.
A análise genômica revelou informações surpreendentes: os habitantes do Saara Verde constituíam uma população isolada, desconhecida até então, que pode ter habitado a região por dezenas de milhares de anos.
A escavação em Takarkori, acessível somente por veículos 4x4, começou em 2003. A primeira múmia foi encontrada logo no segundo dia, quando a equipe escavou a areia e encontrou a mandíbula. Essa pequena comunidade provavelmente migrou para a região durante um dos primeiros grandes êxodos humanos da África, há mais de 50.000 anos.
Harald Ringbauer, coautor do estudo, apontou que a ancestralidade genética desse grupo era notavelmente isolada, particularmente em comparação com a Europa, onde a miscigenação foi muito mais comum. Este isolamento sugere que a área não funcionou como um corredor de migração entre África Subsaariana e Norte da África, apesar das condições favoráveis do Saara naquela época.
As análise anteriores de pinturas rupestres e restos de fauna em sítios arqueológicos em toda a área indicavam que os habitantes eram pastores, insinuando uma possível migração dos pastores do Oriente Próximo, onde a agricultura se originou. No entanto, essa ideia foi posta em dúvida devido ao isolamento genético do grupo de Takarkori, levando os pesquisadores a considerar que o pastoreio pode ter sido adotado através de intercâmbios culturais com outros grupos que já domesticavam animais.
"Agora sabemos que eles eram geneticamente isolados, mas culturalmente conectados. Existem muitas redes que indicam interações com várias partes do continente, como as cerâmicas provenientes da África Subsaariana e do Vale do Nilo", comentou di Lernia.
Louise Humphrey, líder de pesquisa no Museu de História Natural em Londres, concordou com essas descobertas. "O DNA extraído dessas pastoras revela que a maioria de sua ancestralidade remonta a uma linhagem genética norte-africana antiga, anteriormente desconhecida", afirmou. Ela também sugeriu que futuras pesquisas que integrem evidências arqueológicas e genômicas poderão oferecer novos insights sobre as migrações e mudanças culturais na região.
Além disso, Christopher Stojanowski, bioarqueólogo da Universidade do Estado do Arizona, destacou que a descoberta de uma população moderadamente grande e a ausência de endogamia sugerem que havia movimento e conexões sociais, contrariando a ideia de um grupo isolado.
A recuperação de DNA antigo é, de fato, um desafio. Embora especialistas tenha realizado estudos nos esqueletos e artefatos encontrados, as tentativas de extrair DNA tinham se mostrado difíceis. Em 2019, a equipe conseguiu recuperar apenas DNA mitocondrial, o que não ofereceu uma imagem completa. No entanto, com o desenvolvimento de novas técnicas, foram capazes de extrair DNA suficiente para sequenciar os genomas completos das múmias femininas. Isso permitiu uma visão mais clara sobre suas ancestrais, bem como sobre a história da população.
"Um genoma carrega as histórias de muitos ancestrais", concluiu Ringbauer, indicando que a pesquisa em Takarkori não apenas revela os segredos de um período distante, mas também abre novos caminhos para compreender as trajetórias humanas em um momento crucial da prehistória.