Aumenta o uso da geolocalização em processos trabalhistas, mas ainda gera controvérsias
2024-12-18
Autor: Matheus
Recentemente, um caso notório ganhou destaque em tribunais brasileiros: um trabalhador foi condenado a pagar multas por má-fé após o juiz considerar que ele mentiu sobre suas horas trabalhadas. Para fundamentar essa decisão, o magistrado recorreu a dados de geolocalização obtidos através de operadoras de celular e do Google, evidenciando uma tendência crescente no uso de tecnologias digitais nas disputas trabalhistas.
Advogados e especialistas em direito afirmam que o uso de geolocalização está se tornando uma prática comum em casos em que há divergências entre as versões dos trabalhadores e das empresas. Todavia, há um consenso de que a utilização desses dados deve respeitar a privacidade dos indivíduos. Chiara de Teffe, professora de Direito Civil e Direito e Tecnologia no Ibmec, observa que a geolocalização pode ser eficaz em determinados contextos, como nos processos em que se reivindica pagamento de horas extras. Neste cenário, a empresa pode solicitar dados de rastreamento para validar os horários de trabalho do funcionário, oferecendo uma base mais objetiva para a decisão judicial.
Ainda de acordo com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), as empresas com mais de 20 funcionários devem registrar a jornada de trabalho, mas esta regra não se aplica a todos os tipos de profissionais. Por exemplo, gerentes e trabalhadores em atividades externas não estão obrigados a manter o controle de horas, o que abre espaço para possíveis fraudes e disputas.
Fabio Chong de Lima, advogado e especialista em direito trabalhista, observa que o uso de dados de geolocalização é mais comum em processos envolvendo profissionais que trabalham fora do ambiente corporativo. "Um vendedor, por exemplo, que afirma ter trabalhado até as 22h, pode ter seus horários verificados através de dados de geolocalização", observa.
Contudo, essa prática é cercada de questionamentos éticos e legais. Pedro Saliba, advogado da Associação Data Privacy Brasil, enfatiza que dados coletados por meio de aplicativos e redes sociais pertencem à esfera privada e não deveriam ser utilizados indiscriminadamente em processos judiciais. Ele argumenta que as empresas têm à disposição métodos alternativos de controle de jornada, como aplicativos de registro de ponto, que poderiam ser mais adequados à realidade do trabalho remoto e das atividades externas.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) já se manifestou a favor do uso de geolocalização como prova em processos trabalhistas, tendo validado essa prática em um caso envolvendo o banco Santander, onde o profissional reivindicava horas extras. O colegiado considerou a geolocalização uma evidência apropriada e proporcional, desde que respeitasse o sigilo das comunicações.
Além disso, a legislação brasileira, incluindo a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), ampara a utilização de dados pessoais em processos judiciais, desde que garantidas as devidas proteções. Chiara de Teffe afirma que a geolocalização pode contribuir para a justiça das decisões, mas ressalta que deve ser empregada de forma excepcional e com o devido respeito ao direito de defesa dos trabalhadores.
As empresas de telecomunicações e o Google, procurados para comentar sobre a utilização de dados de geolocalização, afirmaram que cumprem as determinações judiciais, mas o debate sobre as implicações éticas e legais desse tipo de evidência continua em voga.