Negócios

Corregedor expõe esquema de fundos que lucram com indenizações de passageiros

2024-12-16

Autor: Matheus

O desembargador Francisco Loureiro, corregedor-geral da Justiça de São Paulo, recentemente se viu envolvido em uma situação que destacou uma prática criticada por ele mesmo: a litigância predatória das companhias aéreas. Após um voo atrasado de várias horas, Loureiro recebeu uma proposta surpreendente enquanto aguardava suas bagagens no aeroporto.

"Enquanto pegava minha mala, recebi um SMS perguntando se queria vender meu crédito devido ao atraso do voo", afirmou Loureiro durante um seminário da Apamagis (Associação Paulista de Magistrados). Ele ficou surpreso ao receber a oferta de um fundo de investimento que estava disposto a pagar cerca de R$ 700 pela sua 'indenização'. Para isso, exigiam que ele preenchesse um formulário detalhando o 'sofrimento' causado pelo atraso, além de um documento de cessão de crédito que autorizava o fundo a litigar em seu nome.

Loureiro levantou um ponto importante durante sua palestra: a legalidade dessa prática. Ele explicou que não existe ilegalidade na cessão de crédito em si, mas questionou como poderia ser considerado o titular do crédito se o houvesse cedido. "Se eu não sou mais o titular do crédito, como posso figurar no polo ativo de uma demanda judicial?", questionou.

O corregedor, intrigado, investigou e descobriu que o fundo envolvido estava prestes a abrir capital na B3, a bolsa de valores brasileira. Ele ressaltou que esse modelo de negócios é insustentável e questionou a ética das empresas que lucram com indenizações que deveriam ser destinadas aos passageiros lesados.

"É inacreditável que esse fundo esteja fazendo dinheiro fácil assim. Se os juízes começassem a aceitar essas ações, o valor da indenização seria desproporcional ao real dano sofrido pelo passageiro. Uma indenização justa em casos assim deveria ser na casa dos R$ 20, o que se, de fato, equivale ao descontentamento por um atraso", comentou.

O corregedor também revelou que a Justiça já está ciente de tais práticas predatórias e mapeando sua ocorrência, algo que preocupa as companhias aéreas, que se sentem sobrecarregadas com o número crescente de processos. A Azul, por exemplo, relata receber cerca de 4 mil ações por mês. Companhias como Gol e Latam também denunciaram essa situação, que consideram abusiva e relacionada ao aumento das tarifas aéreas, levando o governo a considerar medidas para mitigar essa litigância no setor.

Loureiro, por fim, mencionou que se manifestou durante o evento de maneira pedagógica e enfatizou a importância de se entender esses novos desafios no sistema judiciário, sem revelar o nome do fundo de investimento por questões legais relacionadas à Lei da Magistratura.