Nos últimos tempos, a campanha de arrecadação promovida pela torcida Gaviões da Fiel, do Corinthians, tem gerado intensas discussões sobre a cultura de doação no Brasil. Lançada em 27 de novembro, a vaquinha online já arrecadou a impressionante quantia de R$ 25 milhões na primeira semana, com o objetivo de quitar a dívida da construção da Neo Química Arena.

Essa mobilização financeira tem gerado surpresa entre gestores de organizações sem fins lucrativos, que frequentemente enfrentam dificuldades para conseguir doações. Muitos se perguntam: por que as pessoas preferem destinar suas economias a um clube de futebol em vez de apoiar causas sociais? A resposta parece complexa, mas reflete uma visão distorcida sobre o que motiva as doações.

A desconfiança em relação à transparência das ONGs é uma das razões apontadas para a hesitação dos doadores. No entanto, essa lógica parece não se aplicar quando se trata de um clube famoso como o Corinthians, que historicamente enfrenta várias acusações de má gestão financeira, assim como muitos outros grandes clubes do país.

Além disso, há um fator emocional significativo. Torcedores sentem um profundo senso de pertencimento e lealdade ao seu time, algo que vai além de questões financeiras. É comum encontrar dezenas de campanhas de arrecadação online para necessidades como cirurgias e tratamentos médicos que não se aproximam dos milhões levantados para o Corinthians. Isso demonstra uma priorização dos laços sociais e comunitários ligados ao clube, em comparação ao apoio a causas sociais que poderiam impactar a vida de muitas pessoas.

Outro aspecto a ser considerado é a saúde financeira do Corinthians, um dos clubes mais valiosos do futebol brasileiro. Recentemente, foi anunciado um novo contrato de patrocínio que soma R$ 309 milhões até 2026, e os jogadores têm salários que ultrapassam a casa dos milhões. A força financeira do clube gera questionamentos sobre a necessidade de pedir doações de torcedores.

As motivações por trás das doações ao Corinthians não se alinham com a lógica tradicional de filantropia. Em vez disso, refletem uma identificação e um desejo de ver o clube prosperar para que possam viver a experiência de torcer, celebrar vitórias e enfrentar derrotas juntos na arena.

Um estudo relevante, a Pesquisa Doação Brasil, realizada pelo Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS), demonstra que doações impulsionadas pela vontade de ajudar uma causa social são diferentes daquelas que visam apoiar instituições nas quais os doadores se sentem parte, como igrejas e clubes. Essa realidade levanta um alerta sobre como é preciso cultivar uma cultura de doação mais equilibrada no Brasil, onde a generosidade não exista apenas em torno do futebol, mas também abranja causas sociais urgentes.

A vitória da vaquinha para o Corinthians mostra, de forma clara, a força da comunidade corinthiana. Seria maravilhoso se, num futuro próximo, pudéssemos testemunhar essa mesma paixão e mobilização em prol de melhorias sociais, demonstrando que a solidariedade pode e deve ser uma prioridade, assim como a devoção pelo futebol.