Em tempos onde se debate intensamente o que realmente representa o conceito de 'Ocidente' ou 'civilização ocidental', o lançamento do livro 'O Ocidente: Uma Nova História em Catorze Vidas', da arqueóloga e historiadora britânica Naoíse Mac Sweeney, surge como uma leitura indispensável. O principal argumento da obra é claro: aqueles que acreditam que esses conceitos são ancestrais e foram elaborados desde os primórdios da civilização estão muito enganados.

Mac Sweeney, professora do Departamento de Arqueologia Clássica da Universidade de Viena, traça um percurso histórico que vai desde Heródoto, o pai da história grega, no século 5 a.C., até o século 21 em Hong Kong. Em seu trabalho, fica evidente que a construção da identidade cultural e geopolítica do Ocidente foi um processo gradual, que se consolidou bem mais tarde, apenas no século 18.

Surpreendentemente, os próprios gregos e romanos, considerados os fundadores do Ocidente, não se preocupavam tanto com essa ideia. Em várias ocasiões, tentaram estabelecer uma polarização em relação a suas contrapartes asiáticas, mas não demonizavam os adversários. Heródoto, por exemplo, descreveu o conflito entre as cidades-Estado gregas e o Império Persa sem apresentar um ódio exacerbado àquela cultura.

Além disso, outros pensadores da época não se consideravam "europeus" no sentido moderno do termo, mas sim como um povo situado entre a Europa e a Ásia, valorizando elementos de ambas as culturas. O próprio Império Romano se gabava de sua origem troiana, e essa narrativa era utilizada por diferentes dinastias ao longo da Idade Média, incluindo os ingleses.

Os bizantinos, que falavam grego, também não se enxergavam como "ocidentais" devido ao cisma religioso que os separava dos católicos na Europa Ocidental. No século 17, durante o reinado da rainha Elizabeth I da Inglaterra, a diplomacia otomana tentava explorar a ancestralidade troiana para formar alianças improváveis entre protestantes ingleses e muçulmanos, em um movimento contra os católicos espanhólos.

A definição do Ocidente como o conhecemos, exclusivamente europeu e branco, começou a tomar forma somente após o advento do colonialismo, contraditoriamente impulsionado pelo Iluminismo. Nesse período, Grécia e Roma foram amalgamadas em uma narrativa histórica de um único passado ancestral que favorecia os novos dominadores do mundo.

É fascinante perceber como a ideia de 'Ocidente' não é um conceito eterno, mas sim uma construção histórica que foi sendo moldada por necessidades políticas e sociais ao longo do tempo, revelando muito mais sobre a cultura e a ambição de quem a usou do que sobre qualquer realidade objetiva.