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Shoppings: muito mais que um reflexo de juros, afirma Santander

2024-12-23

Autor: Fernanda

As ações do setor de shoppings brasileiros voltaram a ser negociadas em níveis alarmantes, semelhantes aos da pandemia, com múltiplos agora ainda mais descontados do que durante a recessão do governo Dilma, uma situação que gera preocupações sobre a possibilidade de um cenário semelhante sob o governo Lula.

De acordo com análises do Santander, o setor de shoppings está em um verdadeiro jogo de forças entre a alta dos juros e a inflação, com os investidores parecendo ignorar os sólidos fundamentos do negócio que permanecem resilientes.

Historicamente, os shoppings demonstram uma resistência significativa e tendem a superar o Ibovespa em períodos de juros altos e inflação elevada. Além disso, nos primeiros seis meses de um ciclo de contração monetária, as performances costumam ser positivas, segundo os especialistas do banco.

O Santander, por sua vez, mantém uma perspectiva otimista para o setor no próximo ano e reitera sua recomendação "outperform" para ações de empresas como Multiplan, Iguatemi e Allos. A Multiplan destaca-se como a favorita do banco, graças ao seu portfólio robusto de shoppings que atendem classes A e B, além de apresentar resultados sólidos, mesmo com a alavancagem resultante da recompra de ações pela Ontario Teachers.

Os analistas do Santander também preveem um aumento no fluxo de caixa das operações (AFFO) e nos dividendos da Multiplan, caso a empresa consiga vender participações minoritárias e expandir seu landbank ao redor dos shoppings.

Sobre a Iguatemi, embora acreditem que as ações possam passar por uma fase menos favorável até a finalização da transação com a Brookfield, o banco mantém uma visão otimista, considerando que a preocupação do mercado em relação à aquisição do Pátio Higienópolis e Paulista é exagerada.

A Allos, que está sendo negociada em linha com a Iguatemi, possui um yield de dividendos mais atrativo, mas os analistas do Santander alertam que pode apresentar desempenho inferior em momentos de crise quando comparada à Multiplan e Iguatemi. Eles comentam que a carteira atual da Allos pode ser mais resiliente do que a da Aliansce durante a última recessão, considerando os desinvestimentos realizados e a fusão com a BRMalls.

Apesar da percepção negativa em relação ao setor, os analistas afirmam que a força do e-commerce não é um fator isolado que explica a falta de interesse. Em comparação com o mercado global, que não é tão negligenciado quanto o brasileiro, a fraqueza do segmento no país parece se relacionar à baixa liquidez na Bolsa e ao aumento das taxas de juros.

Um exemplo ilustrativo: mesmo com o AFFO por ação da Simon Properties e da Unibail-Westfield (as maiores operadoras nos EUA e Europa, respectivamente) abaixo dos níveis de 2019, esses papéis têm superado seus mercados em 11% e 25%, respectivamente.

No Brasil, onde os shoppings aumentaram seu AFFO por ação em 80% desde 2019, o setor continua a agir de maneira inferior ao restante da Bolsa após o fim da pandemia.

Os investidores reconhecem a visão do Santander sobre a resiliência do setor, mas permanecem cautelosos devido à incerteza sobre o limite final da Selic. Um exemplo disso ocorreu em 27 de novembro, quando o governo anunciou um pacote fiscal "desidratado", resultando em uma queda de 13% nas ações de shoppings, um desempenho pior do que comparáveis como os setores elétrico e de telecomunicações.

Em um ângulo mais positivo, a depreciação do Real pode beneficiar o setor a curto prazo, já que uma moeda mais fraca impacta o Índice Geral de Preços (IGP), ao qual muitas empresas de shopping estão indexadas. Após um período sem reajustes nos aluguéis em 2024, o banco projeta um impacto positivo da inflação devido à aceleração do IGP.

Entre janeiro de 2010 e setembro de 2024, o Santander identificou três momentos em que a Selic e o IGP-M estavam acima da média histórica, assim como na situação atual, e as operadoras de shoppings superaram o mercado em 11,1% durante esses períodos. A Multiplan se destacou nesse cenário, tendo um desempenho melhor que a Bolsa em todas essas ocasiões.

Fanny Oreng, chefe de real estate do Santander, aponta que o mercado está desconsiderando os fundamentos do setor ao focar continuamente no macroeconômico em vez de nas teses específicas das empresas. Para ela, há uma tendência de os investidores priorizarem os retornos implícitos nas ações em detrimento de múltiplos historicamente observados no setor imobiliário, como o cap rate e o 'price to FFO'.

"O mercado frequentemente compara o setor com empresas de utilidades e telecomunicações, que têm lógicas completamente diferentes. O que queremos ressaltar é que o setor de shoppings possui seu espaço no contexto de investimento global, e não podemos esquecer que essas empresas são muito mais do que apenas um reflexo de juros", disse Fanny.